Se um dia a morte me bater à porta, eu vou dizer: “Pois não?” e deixá-la entrar, como visita importante que não esperava receber sem um aviso, logo hoje, a casa nunca está pronta, desculpe a bagunça, pode entrar, enquanto, apressada, vou ajeitando as almofadas do sofá e passando as mãos pelo cabelo. Se um… Continue reading Se um dia ela bater à porta
O corpo feminino e as preposições
«Uma mulher, encontrando-se às cinco da manhã junto de uma igreja e com a bexiga cheia, tem vontade de urinar contra a parede da igreja. A cena ocorre em Jerusalém, o romance de Gonçalo M. Tavares. Chamo a atenção para a preposição escolhida para expressar o desejo desta mulher: esse contra. Ela é bastante significativa… Continue reading O corpo feminino e as preposições
[Escrevo enquanto rego as plantas]
Escrevo enquanto rego as plantas. Em cada uma delas encontro uma voz, um sussurro, um roçagar de folhas que podia ser de saias, de páginas ou de lábios. Estão vivas, sentem, e eu sinto-as: absorvo-as pelos sentidos. Há, no correr da água, um murmúrio fiel, das coisas terrenas que vertem para um rumo certo, prometendo… Continue reading [Escrevo enquanto rego as plantas]
Design de livros: uma leitura criativa
RESUMO: Ao designer cabe escolher a forma do livro. Para bem escolher a sua forma, é imperativo que o designer conheça o texto, porque só assim lhe poderá dar um corpo e uma cara, seja através do desenho da sua capa (aquilo que será a primeira imagem do livro), da escolha das suas dimensões e… Continue reading Design de livros: uma leitura criativa
Carta a uma jovem designer — um apelo à sinestesia
«Pergunta-me uma jovem imaginária o que é preciso para se ser designer (diz-me a estatística que será uma designer, mais provavelmente do que um designer). Respondo-lhe: gostar de arte e de engenharia. E também de agricultura, matemática e geofísica. E cinema, e dança, e literatura.Algumas das melhores aulas de design que tive não foram exatamente… Continue reading Carta a uma jovem designer — um apelo à sinestesia
Do livro como objeto à leitura como evento
«Vários estudos literários exigiam já a presença e a ação do leitor, assim como de outros agentes, para que o texto existisse. […] Mas talvez não se tenha dado ainda a importância devida ao ato que o leitor efetua em cada leitura. Mais ainda: não foi dada a devida importância ao objeto, que funciona tanto… Continue reading Do livro como objeto à leitura como evento
Pombos e maritacas
«No dia 31 de Janeiro de 2014, foram avistadas cinco maritacas na Avenida António Augusto Aguiar. O que faziam ali cinco aves tropicais, soltas em pleno inverno lisboeta? Estes pássaros grandes, coloridos, barulhentos, misturados entre os pombos quietos e cinzentos, passaram despercebidos a praticamente toda a gente que estava à sua volta. Eu reparei. E… Continue reading Pombos e maritacas
Araras e pardais
Um ensaio sobre óptica subjetiva «Um pardal é uma ave extraordinária. As suas plumas cor de madeira de carvalho, com matizes de castanheiro, cedro, mogno e cerejeira cobrindo o peito suavemente arredondado, o seu bico triangular, de uma proporção perfeita, com as arestas curvadas em gentil elegância, os pequenos olhos cheios de brilho, vivacidade e… Continue reading Araras e pardais
Writing for Real
Um ensaio sobre superfícies de inscrição e instâncias de legitimação «’Stop writing on walls’, pode ler-se na parede de uma casa de banho feminina de uma Faculdade de Letras portuguesa. A frase remata: ‘start writing for real’. O apelo parece razoável, mas levanta mais perguntas do que aparenta. Nomeadamente: o que significa writing for real?… Continue reading Writing for Real
Húmus
Húmus, murmúrio mudo,pedregulhos húmidos de bafio e brilho,espectros sombrios de que foge o estio,buxos puídos, denegridos sepulcros…Como pode algo tão lúgubreser tão luminoso?Com uma penada ilumino,com outra, ludibrio. (sobre Húmus, de Raul Brandão)