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Na minha cabeça habita uma máquina de escrever. Sempre lá esteve — mesmo que não sozinha. Ela coabita com uma potente máquina de observar, e essa outra componente acabou por definir o início da minha carreira pelas artes visuais. O meu lado prático direcionou esse percurso para o design, especificamente de comunicação: a palavra lá sempre, como ponte para chegar ao outro.

Escrever é uma forma de organizar o pensamento. Mesmo quando não se chega a inscrever as palavras no papel, elas não se sucedem sem algum cuidado na sua escolha, às vezes voltando atrás para correções, outras vezes para reorganizar a ordem dos argumentos. Por vezes, é exatamente a escolha de uma palavra que nos surpreende aquilo que nos faz re-alinhar esses argumentos. A escrita é um processo de alinhamento de signos que levantam, à sua passagem, sons, imagens, ideias e sensações.

Tive o privilégio de ter passado os últimos seis anos a ler e a escrever — no caso, uma tese de doutoramento.1 Mesmo que, no imediato, tenha voltado àquela que era a minha ocupação anterior: ser designer freelancer,2 certamente não pararei agora de ler e escrever. Mas a forma que essa escrita toma será necessariamente outra, outras, várias — ainda a descobrir, ou sempre a descobrir.

Das minhas formas favoritas, uma delas é a carta. Gosto da ideia de comunicação direta e individual que a escrita implica, de falarmos uns com os outros através da escrita — mesmo com aqueles que não conhecemos e não sabemos que estão à escuta.

Sei que as redes sociais podiam responder a isto, mas já há muito tempo que sinto em relação a essas um grande descontentamento. Há todo um conjunto de questões que me incomodam: o imediatismo, a promoção da popularidade, a forma como um algoritmo mostra ou oculta, como o tempo descarta conteúdos, e como tão facilmente se torna um espaço onde se discute sem respeito pelo outro que não se vê mas sempre está do outro lado.

Dei por mim então à procura de um lugar para explorar ideias através da escrita. Um lugar onde elas não têm obrigação de seriedade, não têm que ir a lado nenhum, apenas são. Mas, mesmo assim, não ficam só comigo: são trocadas. Um lugar onde as ideias e as palavras se testam, se experimentam, e organizam pensamento. De facto, a minha outra forma favorita é o ensaio.

Assim surge este Ensaio Geral. Acendam-se as luzes, vistam-se os fatos, erga-se o cenário… e teste-se. Ele é um tubo de ensaio, uma proveta onde as palavras flutuam em suspensão antes de delas se retirarem conclusões analíticas.

Periodicidade? Não prometo. Imagens? Não garanto. Tema? Provavelmente andará sobretudo pelas áreas da linguagem, da cultura, da visualidade, dos livros, dos museus. E/ou os seus cruzamentos com a vida. A palavra ‘geral’ descreve também este intuito.

Notas

  1. «Instruções de leitura — um estudo sobre convenções de apresentação da palavra escrita», uma tese em Materialidades da Literatura, orientada pelos Prof.s Doutores Manuel Portela e João Bicker, na Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra.
  2. O website http://www.anasabino.com, embora notoriamente desatualizado, ainda serve como portfólio para o meu trabalho de design.

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